A Henrique Guimarães com a medalha conquistada nos Jogos Olímpicos de Atlanta (1996) © Arquivo

O medalhista olímpico reafirmou que o judô guarda princípios inegociáveis e que nenhuma ação é importante se os valores e preceitos ensinados por Jigoro Kano não forem seguidos.

Por Avança Judô
9 de maio de 2024 / São Paulo (SP)

Candidato à presidência da FPJudô da chapa Avança Judô, Henrique Guimarães reafirmou seu compromisso em honrar os valores e princípios fundamentais do judô, ressaltando que nenhuma ação é importante se esses fundamentos não forem seguidos.

Como medalhista olímpico e ex-integrante da seleção brasileira de judô por 14 anos – e até mesmo para honrar seu sensei, o professor Akira Yamamoto –, Guimarães tem o objetivo de manter o projeto de inovação e automação da entidade, mas preservando a tradição e a essência da arte criada por Jigoro Kano em 1882.

Henrique Carlos Serra Azul Guimarães nasceu em 9 de setembro de 1972 em São Paulo (SP) e, seguindo prescrição médica, aos 5 anos começou no judô na Associação de Judô Santana, na Zona Norte da capital, localizada na rua Darzan.

Henrique foi mais um dos milhares de judocas paulistas que tiveram a oportunidade de ter um grande mestre, sensei Akira Yamamoto, professor kodansha hachi-dan (8º dan), notável ex-atleta da seleção brasileira e um dos pioneiros do Brasil nas disputas do circuito internacional.

Guimarães fez a sua estreia na seleção brasileira sênior quando ainda era juvenil, ficando em quinto lugar no mundial. Permaneceu por 14 anos como titular da seleção, tendo participado de três Olimpíadas: Atlanta 1996, Sydney 2000 e Atenas 2004.

Atualmente Henrique Guimarães é gestor técnico do Centro de Excelência Esportiva de São Bernardo do Campo, e como ex-empresário do ramo de granitos e mármores, hoje presta consultoria para empresas e grandes consumidores deste segmento.

Nenhuma expressão superlativa seria capaz de expressar a importância histórica do registro feito no dojô da Sociedade Esportiva Palmeiras em 26 de maio de 2011, onde aparecem os professores kodanshas Paulino Teruo Namie, Sérgio Akira Oide, Shuhei Okano, Zaqueu Rodrigues do Nascimento, Akira Yamamoto e seu aluno Henrique Carlos Serra Azul Guimarães, além do sensei Edson Puglia, o então diretor do departamento de judô do verdão © Arquivo

Nenhuma expressão superlativa seria capaz de expressar a importância histórica do registro feito no dojô da Sociedade Esportiva Palmeiras em 26 de maio de 2011, onde aparecem os professores kodanshas Paulino Teruo Namie, Sérgio Akira Oide, Shuhei Okano, Zaqueu Rodrigues do Nascimento, Akira Yamamoto e seu aluno Henrique Carlos Serra Azul Guimarães, além do sensei Edson Puglia, o então diretor do departamento de judô do verdão © Arquivo

Prescrição médica

“Comecei no judô aos 5 anos com o sensei Akira Yamamoto, e já aos 6 ou 7 anos de idade já comecei a competir. Na minha na infância e até na minha adolescência colecionei resultados medíocres. Nunca havia disputado uma final do campeonato paulista. Mas, para a minha sorte, tanto o meu sensei quanto meu pai foram muito pacientes e sempre me deram todo apoio.”

De origem simples e filho de imigrantes cearenses, Henrique morava em Guarulhos, mas treinava judô na zona Norte da capital. Contudo, chegou um momento que seu pai não conseguiu mais arcar com as despesas e ele teve de parar.

Após alguns meses seu sensei foi até a oficina em que seu pai trabalhava como funileiro para perguntar o que havia acontecido com seu filho. E o senhor Gersino Guimarães justificou que ele havia parado porque estava numa fase difícil na escola e precisava estudar muito.

Indignado com o afastamento do aluno dedicado, após mais 60 dias, sensei Yamamoto retornou à oficina e pressionou o pai, que dessa vez achou por bem falar a verdade e explicar que Henrique havia parado porque ele não possuía mais condições de pagar as aulas de judô do filho.

Na mesma hora o professor Akira disse que ele não precisaria pagar mais e muito menos parar de treinar judô, e assim Henrique retomou os treinos.

Mesmo com pouca idade Henrique viajava de ônibus e ia sozinho de Guarulhos a São Paulo quase todos os dias. “Eu pegava um ônibus lá na Vila Nilo, na divisa da capital com Guarulhos, e mesmo com apenas 6 anos ia até Santana sozinho. Eu descia no ponto final da linha e depois caminhava feliz para o dojô.”

Henrique Guimarães com o deputado federal Evandro Roman na sede do CREF4/SP em 2022 © fpjcom

Henrique Guimarães com o deputado federal Evandro Roman na sede do CREF4/SP em 2022 © fpjcom

Valores imutáveis

Ao recordar a dedicação e o comprometimento pedagógico do seu sensei na difusão dos verdadeiros valores e princípios do judô, emocionado Guimarães pontuou os aspectos educacionais de sua vivência com sensei Yamamoto.

“Para abordar este aspecto de minha experiência com a cultura japonesa e podermos avaliar como esta vivência impactou aquela criança filha de imigrantes nordestinos, é preciso partir da premissa que ser judoca é um estilo de vida. E foi isso que meu sensei buscou fazer comigo e com outros colegas na mesma condição social que eu, pois, na verdade, embora eu só pudesse perceber isso 30 ou 40 anos depois, esse foi o verdadeiro legado deixado por ele para seus principais alunos.”

Segundo o medalhista olímpico, seu professor exibia técnica refinada e excelente pedagogia, mas o que ele mais trabalhava com seus alunos eram os princípios e valores do judô. Questões como o respeito mútuo, obediência à hierarquia, honra aos pais e à família e, sobretudo, culto à simplicidade e à humildade.

“Acho que é por esse trabalho que hoje entendo que o judô guarda princípios inegociáveis e nenhuma ação importa se os valores e princípios ensinados pelo nosso grande mestre Jigoro Kano não forem respeitados e cultuados.”

O que sensei mais trabalhava com seus alunos eram os Princípios e Valores do judô. Questões como o Respeito Mútuo, Obediência à Hierarquia, Honra aos Pais e à Família e, sobretudo, culto à Simplicidade e à Humildade.

“Ele sempre pregou que os ensinamentos aprendidos no judô devem ser usados pelo praticante não só em si mesmo, mas também para oferecer bem-estar a todos que estão a sua volta.

Uma fala recorrente dele era que o progresso pessoal só é alcançado plenamente com a ajuda e a solidariedade ao próximo.

Ele pregava que o espírito de respeito ao oponente e que o reconhecimento da importância e da manutenção da integridade física de todo e qualquer colega de treino ou de competição eram quesitos de fundamental importância.

Ele também dizia sempre que não devemos menosprezar o adversário nem tomar nenhuma atitude arrogante ou de superioridade.”

Henrique Guimarães dando autógrafos nos Jogos de Atenas 2004 © Morten Torp / Olympedia 2004

Henrique Guimarães dando autógrafos nos Jogos de Atenas 2004 © Morten Torp / Olympedia 2004

Filosofia de vida

Segundo Henrique Guimarães, hoje, aos 52 anos de idade, é possível perceber com clareza que os princípios do judô podem e devem ser aplicados em todas as áreas da vida.

“Nós, judocas, somos formados não apenas como lutadores, mas como cidadãos, para agir de forma correta e íntegra na sociedade.

Com tantos benefícios, o judô oferece uma formação completa: física, espiritual e moral. Mas, para que este processo realmente se concretize, é preciso que todos estes princípios balizem nossos atos e sejam aplicados em nosso dia a dia.”

Fim do Dojô

Por ser uma alma benevolente com a questão financeira, sensei Akira Yamamoto acabou encerrando as atividades no seu dojô e passou a dar aulas no departamento de judô da Sociedade Esportiva Palmeiras.

“Em 1983 o sensei encerrou as atividades do seu dojô e foi para o Palmeiras, e todos nós que treinávamos gratuitamente ficamos sem escola. Posteriormente, fui chamado para fazer um teste Palmeiras, e felizmente fui aprovado. Foi dessa forma que iniciei a minha trajetória no clube.”

Divisor de águas

Aproveitando a onda de descendentes de japoneses que migraram para o Japão para trabalhar na indústria, em 1989 sensei Yamamoto deixou o dojô no Palmeiras e foi para a terra de seus ancestrais. Para o seu lugar contrataram o sensei Tomio Aoki, que dava aula no Sesc Pompeia e no do Corinthians.

“Este foi um momento muito marcante, pois eu havia treinado por 12 anos com sensei Akira e sua ida para o Japão mexeu muito comigo. Éramos muito próximos. Eu chegava no dojô às 16 horas e ficávamos fazendo uchi-komis até a noite, quando meu pai ia para casa e passava para me pegar. Como japonês, Akira era muito reservado, mas também gostava muito de mim. Era muito atencioso e carinhoso, não usava o shinai e não admoestava muito os alunos. Ele nos explicava tudo pacientemente e não cobrava resultados, era um sensei muito bom.”

“Mas, por outro lado, confesso que o impacto dessa perda originou um ponto de inflexão em minha trajetória nos tatamis. Pouco tempo depois houve uma competição classificatória para o campeonato brasileiro e, mesmo ficando em terceiro lugar, competi e fui campeão brasileiro juvenil. Acho que tudo aquilo que eu havia treinado com sensei Akira aflorou e com isso mudei minha postura no shiai-jô – e tudo começou a dar certo.”

Henrique jamais havia participado de uma seletiva até 1990, quando venceu a prova realizada em Santa Cruz, no Rio de Janeiro. Mas se tratava da classe sênior, e ele ainda era juvenil. Acabou ficando em quinto lugar no campeonato pan-americano sênior. 

Depois de ter queimado a etapa juvenil, foi vice-campeão mundial júnior em 1992.

Nesse mesmo ano disputou a seletiva para Barcelona e os finalistas da chave foram Rogério Cardoso Sampaio, que vinha da escola do renomado professor kodansha Paulo Duarte; Sérgio Pessoa, aluno do lendário sensei Fukio Nakano; Marco Antônio da Costa, o Rato, oriundo da escola que se tornou importante referência no Vale do Paraíba capitaneada pelo professor kodansha Orlando Sator Hirakawa, e Marco Antônio Barbosa, o Barbosinha, aluno do sensei Umakakeba que hoje comanda uma franquia de judô e jiu-jitsu com presença em vários países; e Emir Vilalba, grande destaque dos tatamis da Associação de Judô Gaba de São Leopoldo, no Rio Grande do Sul.

“Disputei a vaga olímpica com o Sérgio Pessoa, que àquela altura já era meu sensei no Palmeiras. Ele venceu e, do outro lado, Rogério Sampaio venceu o Sérgio, foi para Barcelona e conquistou o segundo ouro olímpico para o judô do Brasil.” 

Em 1993 Henrique operou o menisco e perdeu a seletiva para a seleção brasileira retornando somente em 1994. Nunca mais saiu, até se aposentar.

Em 1996 conquistou o bronze nos Jogos Olímpicos de Atlanta, mas a sua longa trajetória na seleção brasileira proporcionou uma infinidade de pódios e conquistas importantíssimas para o judô brasileiro. Entre elas, dois bronzes nos Jogos Pan-Americanos de Mar del Plata (1995) e de Santo Domingo (2003), o vice-campeonato mundial júnior (1992), o vice-campeonato por equipes no mundial da Bielorrússia (1998), o bicampeonato pan-americano e o hexacampeonato sul-americano.

Lembrando os nomes dos técnicos decisivos em sua trajetória, Guimarães mencionou seu sensei Akira Yamamoto, Tomio Aoki, Sérgio Pessoa, Solange Pessoa, Zaqueu Rodrigues do Nascimento e Ikuo Onodera.

“Além do aprendizado que tive com sensei Onodera, ele me ajudou muito devido às minhas dificuldades, assim como fez o professor Francisco de Carvalho. Ambos foram muito efetivos em minha trajetória.”

Henrique Guimarães em encontro realizado pela Secretaria de Esporte do Estado de São Paulo em 2019 © fpjcom

Henrique Guimarães em encontro realizado pela Secretaria de Esporte do Estado de São Paulo em 2019 © fpjcom

Judô é tudo

Formado em educação física, Henrique assegura que o judô lhe deu tudo que possui na vida: formação, educação, preparo e conhecimento.

“Jamais esqueço minha origem, a qual reverencio, e sou grato a Deus. Tive a sorte de ter pais maravilhosos e a prática do judô me permitiu conhecer mais de 60 países dos cinco continentes. Por meio da minha vivência nos tatamis consegui me posicionar, pois antes eu era muito introspectivo e retraído. E o judô também me ajudou nesse processo de posicionamento comportamental.”

“Conheci minha esposa, a Andréa de Carvalho Campos Guimarães, em 1991, também por causa do judô, e com ela alcancei o título mais importante da minha vida que é o de ser pai. Tivemos o Diego e o Leonardo e, durante toda a nossa trajetória, que já leva 32 anos, o judô balizou e deu suporte à nossa relação.”

“Sou, portanto, grato pelos pais, pela família que possuo, e devo tudo isso ao que vivenciei nos tatamis. Hoje enfrento quiçá o maior desafio da minha vida como judoca, fazendo parte da chapa que pretende dar continuidade ao excelente trabalho que vinha sendo realizado na entidade pela diretoria que nos últimos três anos projetou a gestão a patamares impensáveis, tanto na área técnica, quanto na gestão propriamente dita.”

Futuras gerações

Sobre o desafio assumido à frente da chapa Avança Judô, o medalhista olímpico afirma que sua meta, caso seja eleito, é devolver à modalidade tudo que ela lhe proporcionou.

“Nossa proposta consiste em seguir os projetos desenvolvidos nos três últimos anos, visando a modernizar toda a operação da nossa entidade. Não pretendemos reinventar a roda ou tirar o foco dos projetos que estão recolocando a FPJudô na vanguarda do judô mundial nas áreas técnica e de inovação em programas de gestão.”

Como prioridades da sua administração Guimarães mostrou muita ambição. “Temos de desenvolver projetos que proporcionem melhor retorno aos professores e técnicos. Pretendemos dobrar o número de filiados pessoas físicas no próximo quadriênio, o que depende diretamente do nível de comprometimento da nossa administração com os professores e instrutores, bem como deles com a nossa entidade.”

Antes de finalizar o candidato da chapa Avança Judô reiterou o seu compromisso com tudo aquilo que vivenciou e aprendeu com seu sensei. “Entendo que o judô possui princípios inegociáveis, e nenhuma ação ou projeto é realmente importante se os valores e princípios ensinados pelo mestre Jigoro Kano não forem seguidos. Este é meu compromisso com nossos filiados e será meu legado para as futuras gerações de judocas paulistas.” 

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